No olho do furacão
Por Isabela Araújo
6h30 da manhã, o smartphone vibra no criado mudo fazendo um barulho que acorda mais um dos 12,145 milhões de usuários do gadget só no Brasil. Antes de se levantar da cama o dono do celular confere suas redes sociais; primeiro o Facebook, depois o Twitter. Um assunto é unanimidade: um terremoto de 8,9 graus na escala Richter atingiu o Japão provocando o caos no local. Alguns fazem piada com o caso, outros discutem o assunto e outros reproduzem a notícia. Não se sabe de onde aquela informação veio, mas uma coisa é fato: o terremoto aconteceu.
Sem se impressionar com o ocorrido o usuário se levanta, lava o rosto, escova os dentes e vai até a cozinha, onde estão sua mãe e seu pai, cerca de 25 anos mais velhos, não usuários de smartphone e nem de redes sociais. Os pais ligam a pequena TV que fica em cima da geladeira e também tomam conhecimento da catástrofe; um dos maiores canais do país está divulgando a notícia. Os pais se impressionam com o fato e as interjeições de espanto são inúmeras. Sem se exaltar, o jovem que já havia sido informado sobre o terremoto contenta-se em soltar apenas um “eu já sabia”. Ao que seu pai, em tom de repreensão, diz:
-Você passou a madrugada inteira assistindo TV de novo?
-É claro que não. Isso já está na internet inteira.
-Ainda não são nem sete horas da manhã. Você JÁ ligou o computador? Pergunta a mãe.
-O computador está em estado de espera porque eu estava dormindo, mas meu celular fica ligado e conectado 24 horas por dia.
Um celular e 140 caracteres. Em março de 2011 não é preciso nada além disso para informar o mundo inteiro sobre uma das maiores tragédias do século.
Há cerca de trinta anos a notícia provavelmente chegaria por fax ou telex, mas apenas aos maiores veículos de comunicação do mundo, que teriam que enviar correspondentes ao local para a obtenção de imagens e dados mais apurados. O volume de informação que chega hoje pela internet em 24 horas levaria semanas para atravessar o globo.
E foi justamente nesta época que se iniciou uma movimentação tímida que resultou no despertar súbito do compartilhamento de informações em níveis astronômicos. Os pensamentos libertários da década de 1960 influenciando a ação do público sobre o conteúdo, a popularização da impressão, o videocassete que permitia gravar as informações, o walkman que permitia ao usuário escolher as próprias músicas no lugar de se submeter à programação das rádios, seguidos pela massificação dos aparelhos de telefone, câmeras fotográficas, celulares, computadores e claro, da internet. O modelo bilateral de comunicação desaba e a multilateralidade firma seus primeiros pilares em um universo que hoje pode ser interferido, comentado, escutado, escrito, criticado por qualquer um que tenha um interesse mínimo sobre o assunto.
Sobre as consequências dessa revolução... bom, todos sabem que não é possível perceber o “estrago” quando se está no olho do furacão. O que os 600 milhões de usuários do Facebook e os 200 milhões do Twitter irão causar ao universo da comunicação ainda é desconhecido. A ponta do iceberg começa a criar forma incluindo no mercado, profissionais multitarefas, que além de redigir também precisam planejar estratégias de comunicação, de construção e estabilidade do nome de seu veículo em um ambiente inóspito. Já se sabe também que não há ditadura que consiga calar uma comunidade. Como ocorreu há poucas semanas no Irã, se a tentativa for de barrar a internet, existirão os celulares, as câmeras e até mesmo os maiores nomes da web se mobilizando para levar a voz a todos. Um novo espectador também se forma. Surge um público que já não se impressiona devido ao volume de informações que recebe, e que por isso busca o diferencial nas notícias que digere minuto a minuto. Mas estas, apesar de concretas, ainda são características embrionárias e ainda é cedo demais para fugir de qualquer certeza que não seja a própria revolução.