No olho do furacão

21-03-2011 20:39

 

Por Isabela Araújo

 

6h30 da manhã, o smartphone vibra no criado mudo fazendo um barulho que acorda mais um dos 12,145 milhões de usuários do gadget só no Brasil. Antes de se levantar da cama o dono do celular confere suas redes sociais; primeiro o Facebook, depois o Twitter. Um assunto é unanimidade: um terremoto de 8,9 graus na escala Richter atingiu o Japão provocando o caos no local. Alguns fazem piada com o caso, outros discutem o assunto e outros reproduzem a notícia. Não se sabe de onde aquela informação veio, mas uma coisa é fato: o terremoto aconteceu.

 

Sem se impressionar com o ocorrido o usuário se levanta, lava o rosto, escova os dentes e vai até a cozinha, onde estão sua mãe e seu pai, cerca de 25 anos mais velhos, não usuários de smartphone e nem de redes sociais. Os pais ligam a pequena TV que fica em cima da geladeira e também tomam conhecimento da catástrofe; um dos maiores canais do país está divulgando a notícia. Os pais se impressionam com o fato e as interjeições de espanto são inúmeras. Sem se exaltar, o jovem que já havia sido informado sobre o terremoto contenta-se em soltar apenas um “eu já sabia”. Ao que seu pai, em tom de repreensão, diz:

 

-Você passou a madrugada inteira assistindo TV de novo?

-É claro que não. Isso já está na internet inteira.

-Ainda não são nem sete horas da manhã. Você ligou o computador? Pergunta a mãe.

-O computador está em estado de espera porque eu estava dormindo, mas meu celular fica ligado e conectado 24 horas por dia. 

 

Um celular e 140 caracteres. Em março de 2011 não é preciso nada além disso para informar o mundo inteiro sobre uma das maiores tragédias do século. 

 

Há cerca de trinta anos a notícia provavelmente chegaria por fax ou telex, mas apenas aos maiores veículos de comunicação do mundo, que teriam que enviar correspondentes ao local para a obtenção de imagens e dados mais apurados. O volume de informação que chega hoje pela internet em 24 horas levaria semanas para atravessar o globo.

 

E foi justamente nesta época que se iniciou uma movimentação tímida que resultou no despertar súbito do compartilhamento de informações em níveis astronômicos. Os pensamentos libertários da década de 1960 influenciando a ação do público sobre o conteúdo, a popularização da impressão, o videocassete que permitia gravar as informações, o walkman que permitia ao usuário escolher as próprias músicas no lugar de se submeter à programação das rádios, seguidos pela massificação dos aparelhos de telefone, câmeras fotográficas, celulares, computadores e claro, da internet. O modelo bilateral de comunicação desaba e a multilateralidade firma seus primeiros pilares em um universo que hoje pode ser interferido, comentado, escutado, escrito, criticado por qualquer um que tenha um interesse mínimo sobre o assunto.

 

Sobre as consequências dessa revolução... bom, todos sabem que não é possível perceber o “estrago” quando se está no olho do furacão. O que os 600 milhões de usuários do Facebook e os 200 milhões do Twitter irão causar ao universo da comunicação ainda é desconhecido. A ponta do iceberg começa a criar forma incluindo no mercado, profissionais multitarefas, que além de redigir também precisam planejar estratégias de comunicação, de construção e estabilidade do nome de seu veículo em um ambiente inóspito. Já se sabe também que não há ditadura que consiga calar uma comunidade. Como ocorreu há poucas semanas no Irã, se a tentativa for de barrar a internet, existirão os celulares, as câmeras e até mesmo os maiores nomes da web se mobilizando para levar a voz a todos. Um novo espectador também se forma. Surge um público que já não se impressiona devido ao volume de informações que recebe, e que por isso busca o diferencial nas notícias que digere minuto a minuto. Mas estas, apesar de concretas, ainda são características embrionárias e ainda é cedo demais  para fugir de qualquer certeza que não seja a própria revolução.

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Data: 25-03-2011

De: Isabela Araújo

Assunto: Mídias Sociais e Jornalismo

Apesar das inúmeras planilhas e infográficos com números, as redes sociais ainda são um ambiente um tanto quanto imprevisível. É possível ter uma noção do retorno de cada conteúdo, mas duas imagens praticamente iguais podem causar efeitos totalmente discrepantes se forem postadas por exemplo, em horários diferentes do dia. Existem algumas certezas sobre os tamanhos dos textos, sobre os horários de maior "ibope", sobre a necessidade da interação, mas os relacionamentos na web ainda representam um ambiente que exige muito estudo e análise, o que a maioria dos veículos não percebe.

O potencial das redes, pelo menos no Brasil, também ainda encontra-se muito subestimado. As próprias empresas que se intitulam "agências digitais" trabalham apenas com gestões de perfis de seus clientes. Às vezes por uma questão financeira, às vezes por uma questão de falta de conhecimento, o potencial de uma marca ou veículo não é totalmente explorado na rede, a inteligência de estratégia e administração não é colocada em prática e as marcas não conseguem desenvolver mais do que o básico na internet; esquecendo das amplas possibilidades de produção de vídeos, webséries, ações que envolvem realidade aumentada, promoções, etc.

Acredito que o fato de todos serem difusores de informação não é mesmo o grande problema. Os jornais "confiáveis" também estão disponíveis para os usuários que desejarem se aprofundar mais nos assuntos em pauta, discutidos supercifialmente por Twitter ou Facebook.

O erro dos veículos de comunicação hoje é o de tentar transformar a interação em algo robótico. Os scripts para postagem automática estão em quase todos os portais, que acreditam que volume na web é mais importante do que qualidade. Notícias postadas minuto a minuto, muitas vezes sem qualidade ou aprofundamento, sendo postadas nas redes sociais, num verdadeira guerra por seguidores e fãs.

Temos com o Estadão um exemplo que ainda não é o ideal, mas se aproxima de uma ação de qualidade. O jornal mantem a qualidade de seus textos e, mesmo em seu portal ainda posta matérias elaboradas e nem todas são divulgadas nas redes já que a postagem não é automática, porém apresenta textos muito extensos, o que não corresponde com o dinamismo da plataforma.

A revista Rolling Stone BR chega ainda mais perto de um modelo ideal. Algumas notícias selecionadas são divulgadas nas redes, seu texto não é extenso mas ainda sim, completo.

A Folha de São Paulo ainda adota o modelo automático, postando inúmeras notícias por dia, muitas delas irrelevantes e superficiais, porém destaca-se em um item: a interação. O veículo está sempre em contato com seu público, respondendo questões, agradecendo elogios e fazendo até mesmo ações como "#FF" no Twitter.

Portanto, é complicado apontar com precisão o que é de fato certo ou errado, até porque, existe a subjetividade, presente na interpretação de cada um, moldado por seus costumes e por sua rotina. Uma pessoa que não trabalha pode preferir textos mais extensos e elaborados, outra pessoa muito ocupada pode preferir publicações que vão direto ao assunto. A melhor resposta talvez seja mesmo a análise, de cada público e de cada reação.

Data: 24-03-2011

De: Lorena

Assunto: Mídias Sociais e Jornalismo

Ótimo texto, Isabela.

Minha questão: como tem sido sua experiência como analista de mídias sociais? O que você considera bons e maus usos das redes no Jornalismo atualmente?

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