Fruto novo – e saboroso – nos campos da comunicação

21-03-2011 22:14

Por Rafael Soal 

 

O diretor de notícias globais da BBC recomendou a todos os colegas de profissão. A professora de Jornalismo On Line também não cansa de alertar os alunos. Não importa o degrau que esteja o jornalista, ele tem de haver com uma nova realidade. A Internet e as mídias sociais chegaram para ficar! Portanto, é bom repensar a forma de se fazer jornalismo.

Se o leitor precisa de provas cabais para entender, vamos a uma muito recente: um terremoto de proporções gigantescas atingiu o Japão. Se esse fato tivesse acontecido há uns dez anos, ou até menos, nós receberíamos a notícia – talvez – no mesmo dia, mas nossos olhos, predadores vorazes de imagens, teriam que esperar um pouco mais. Teríamos que contar com a sorte de algum cinegrafista, com seu pesado equipamento em mãos, estar próximo ao local, e em um lugar seguro, para que este registrasse, enviasse as imagens ao canal de televisão, para então serem retransmitidas para o mundo inteiro. 

Mas esse terremoto foi há poucos dias. E soubemos da notícia quase que instantaneamente. E nossos olhos nem morreram de fome: a toda hora chegavam imagens de todos os lugares, de todos os ângulos possíveis, com todo tipo de qualidade que se possa imaginar. Mas como? O número de jornalistas aumentou naquele pequeno país? Não. O que aumentou foi a tecnologia. O que aumentou foram os números de celulares. O que chegou foi o Youtube. Os próprios cidadãos japoneses, mesmo em meio ao desespero de ver suas casas indo abaixo, ainda tinham um tempinho para posicionarem a câmera de seu Iphone e mostrar ao mundo todo cenas terríveis, a realidade que eles estavam vivendo. O mundo todo sentiu, de alguma forma, a sensação de ter o chão esmaecendo sob os seus pés. Só faltou mesmo o 3-D.

Compreenderam? Não podemos mais enxergar o jornalismo como uma via de mão única. Hoje, como afirmou o professor Rosental Calmon, a tarefa do jornalista não termina quando a reportagem fica pronta. Agora o outro lado também é importante. É importante ouvir e estar atento aos comentários dos leitores, ao que eles estão pensando, porque agora eles fazem parte da comunicação. E as redes sociais têm grande parcela de culpa. Se você, leitor, tem um Twitter, você é transmissor de informação em potencial.

Esta ferramenta aparentemente simples criou um reboliço no meio jornalístico. O Twitter pode ser uma fonte? As informações disponíveis no Twitter são dignas de confiança? A jornalista Vany Laubé defende que o Twitter pode ser um bom gatekeeper, e seus usuários, consequentemente, gatekeepers em potencial. Um usuário que segue o Twitter de um veículo de comunicação – o G1, por exemplo – é bombardeardo diariamente com as notícias publicadas no site. O usuário, no momento em que retwitta uma delas, seleciona “aquela” informação, pois de acordo com seus critérios, julgou ser muito interessante, a ponto de seus seguidores merecerem ler aquilo. Mas nessa curta explicação já podemos perceber a importância do jornalismo. O leitor consegue perceber?

O Twitter é uma faca de dois gumes. Ele pode ser o maior algoz do jornalista preguiçoso, mas pode ser um leal escudeiro do jornalista que corre atrás, que investiga, que apura. Cento e quarenta caracteres não podem nunca nos entregar uma notícia pronta, acabada, esperando ser copiada, colada e modificada. O vocalista do Strokes, Julian Casablancas, deve rir até hoje de seu feito. Num determinado dia de janeiro, ele postou em seu Twitter a capa do novo disco de sua banda. Loucos por um furo, o que mais foi visto foram portais como Terra e até nosso exemplo acima, o G1, explodindo a manchete: “Vocalista do Strokes disponibiliza no Twitter a capa do novo álbum”. Pois bem, a foto era uma pintura, uma simples pintura, que nosso band leader hype achou bonita, e resolveu fazer uma pegadinha. Cadê a apuração? Cadê o faro, cadê a desconfiança? É isso mesmo, um cantor de rock engraçadinho ensinou à imprensa uma grande lição: nem tudo que reluz no Twitter é ouro.

Por último, acho que vale uma observação interessante esmiuçada muito bem o escritor Chris Anderson em seu livro ‘A Cauda Longa’. Imagine você leitor, um mundo repleto de água e com apenas algumas ilhotas emergindo na superfície. Com o passar dos anos, o nível da água vai diminuindo, e assim, as terras que ficavam emersas sobem. Agora imagine o que será esse mundo após milhares de anos. É exatamente isso que está contecendo agora. Estamos vivendo o crescimento dos mercados de nicho.

A Internet proporcionou a nós uma capacidade aparentemente ilimitada. A notícia, anos atrás, era o que entrava no jornal que nossos avós sempre liam na varanda de casa, logo ao amanhecer. Hoje a notícia está em todos os lugares. Ela está nos sites, nos podcasts, nos blogs, no Twitter. Estima-se que atualmente existam uns duzentos milhões de blogs na rede. E, pode ter certeza, todos eles tem pelo menos em torno de dois acessos por dia.

Esse é o mercado de nicho. Pessoas procurando informações específicas sobre uma banda, sobre um disco que não está mais no mercado. Pessoas procurando um ângulo diferente do terremoto do Japão. E engana quem pensa que qualquer nota é capaz de sacia-los. Público muito exigente, esse. Eles querem textos ricos, bem embasados, devidamente apurados, e, principalmente, com diferencial. Essa é a palavra que pode fazer um leitor deixar de dar atenção à sua matéria, porque logo ali na frente, no quarto “O” do Google, tinha outra que tratava do mesmo assunto, mas era mais completa.

Se olharmos esses números que nos fazem até perder os sentidos, constatamos então que a função do jornalista não vai acabar. Existem milhares de mercados segmentados ávidos por informação, informação essa que ainda não viu a luz do dia. Informação esperando a competência necessária para “nascer”. Se tudo tem dois lados, por que enxergar nas mídias sociais o fim do mundo? Por que não avistar um lugar  “onde tudo que se planta, dá”?

E a preguiça, jornalistas, é coisa de passarinho azul.

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Data: 08-09-2011

De: Cael Sabino

Assunto: Um leitor

Rafael, sou um desses leitores a que você se refere em seu texto. Um daqueles que você pergunta se percebe o novo trabalho jornalístico.
Brilhante seu texto!
Com muita clareza mostra que novas ferramentas estão surgindo para o jornalista consciente de seu trabalho!
Parabéns e siga divulgando, esclarecendo e gerando entusiasmo.
Grande abraço!

Data: 25-03-2011

De: Rafael Soal

Assunto: Leve, gostoso e consistente. Como sobremesa.

Lucas, primeiro obrigado pelo carinho com o texto. Mesmo.

Acredito que é nesse ponto, ao contrário daqueles que tiraram o mérito de nosso curso, que está o nosso grande trunfo: o conhecimento que adquirimos na faculdade.

Todos podem gerar informação, mas cada um a transmite do jeito que acha correto. Nós temos as regras, as formas de se produzir uma boa notícia. A faculdade aguçou nossos sentidos a ponto de perceber, entre dez acontecimentos, o que pode ser uma boa notícia. No caso que citei no texto, o Julian Casablancas publicar um quadro e dizer que é a capa do novo disco (e estava na cara que não era. A figura estava mal recortada, com qualidade muito inferior e sem nenhuma referência como nome ou título do álbum). Mas pode ser uma matéria legal e que muita gente vai procurar (como eu mesmo fiz, e fiz demais) um apanhado da conturbada gravação do 'Angles'.

O que não podemos fazer é sentar em tronos de ouro e achar quem, tendo o domínio de normas, somos superiores. Não mesmo. Já li muitos textos de pessoas que não são jornlaistas e são muito bons! São atraentes, são gostosos de ler. Dá vontade de ler novo.

Acho esse um ponto muito interessante que o mercado de nicho ensinou ao jornalismo: a forma de escrever. Um escrever leve, mas que traga o peso de uma informação consistente. As pessoas procuram informação, isso é fato. Mas acredito que os textos, a forma de lidar com as palavras, deve ser mais próximo do leitor. É como comer uma saborosa sobremesa: alimenta o corpo e faz bem pro espírito.

E como já li textos seus, sei que deve concordar com alguma coisa que escrevi.

Grande abraço!

Data: 24-03-2011

De: Lucas Oliveira

Assunto: Um novo mundo

Rafael, esta foi uma excelente e didática definição dos caminhos híbridos que a comunicação irá desbravar nos próximos anos. Ressalto aqui o seu último parágrafo, que fala sobre o futuro do ofício de jornalista. Realmente campos e mercados "altamente segmentados" não faltarão para que os profissionais desenvolvam suas habilidades e conhecimentos específicos.

Gostei muito do que disse: "Informação esperando a competência necessária para 'nascer'". No fundo é tudo mais ou menos por aí. Temos infinitas plataformas de linguagem disponíveis para todo tipo de expressão, mas o mundo virtual também carece de indivíduos com a capacidade de criar conteúdos realmente bem apurados, com relevância.

A overdose de redes sociais, blogs, sites de relacionamento e endereços eletrônicos que vive a internet é fruto exatamente disso - muitas pessoas falando, mas poucas realmente habilitadas para o fazer.

Diante dessa realidade, fica aqui o meu questionamento: "De que maneira, na sua opinião, os profissionais de jornalismo irão conquistar credibilidade na rede diante de um mundo em que todos têm voz, espaço e vez?"

Valeu, meu caro! Aquele abraço!

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