Bullying não é brincadeira

03-11-2010 08:20

Viviane A Araújo

Aluna do 7º Período de Jornalismo

 

 

Jayme Borges, jornalista, foi gordinho dos 5 aos 15 anos de idade. Nesse período, era constantemente chamado de “baleia” e “rolha de poço” pelos colegas da escola, do inglês e da natação. Esse pode ser um caso típico de bullying, palavra oriunda da língua inglesa e que significa, literalmente, valentão. Entretanto, no meio acadêmico bullying quer dizer “todo o tipo de atitudes agressivas, verbais ou físicas, praticadas repetidamente por um ou mais estudantes contra outro aluno”, segundo a psicopedagoga Maria da Consolação Oliveira. Na época em que Jayme sofria com a violência psicológica, essas piadinhas e comentários podiam ser consideradas meras “brincadeiras” de criança. “Os professores muitas vezes me recriminaram - especialmente os de educação física - e os diretores e os inspetores não faziam nada, apartavam apenas quando estritamente necessário”, conta Jayme.

 

Outra vítima de bullying foi o analista de sistemas André Coura. Além de gordinho, André era muito alto. A soma desses fatores fez com que ele se tornasse motivo de chacota para as demais crianças. Com a constante hostilização, André se tornou agressivo. Na escola, foi orientado pela direção a tentar dialogar antes de tomar qualquer providência contra os agressores. Mesmo contando com o apoio de seus pais, ele optou pelo isolamento e começou a evitar os locais nos quais era perseguido, além de ter passado a frequentar ambientes nos quais a sua altura e peso eram diferenciais, e não problemas. Segundo André, a dificuldade foi grande no início, mas, com o tempo, o problema foi reduzido. Hoje com 1,86m de altura e pesando 105kg, o analista de sistemas acredita que esta perto do peso perfeito.

 

Fato é que, recentemente, esses atos obtiveram destaque e passaram a ser encarados como forma de violência escolar, considerada extremamente prejudicial para o desenvolvimento psicológico e pedagógico de crianças e adolescentes. No Brasil, de acordo com pesquisa divulgada em abril desse ano pela organização não-governamental Plan Brasil, quase um terço dos estudantes brasileiros cursando entre a 5ª e a 8ª série do primeiro grau já sofreu maus tratos. Ainda de acordo com a pesquisa, 28% dos 5.168 estudantes entrevistados foram agredidos em 2009. O mesmo estudo constatou, ainda, que a forma mais comum de bullying no Brasil é a cibernética, isto é, aquela cometida a partir do envio de e-mails ofensivos e difamatórios em sites de relacionamento como Orkut.

 

Já de acordo com a psicóloga Kelly Azevedo, existem algumas pistas que podem ajudar a identificar tanto o agressor quanto a vítima do bullying. Ela afirma, por exemplo, que o agressor geralmente perde a noção de respeito, se torna sarcástico e passa a não demonstrar nenhuma preocupação com o outro, enquanto a vítima se isola do convívio social ou se torna agressiva.

 

Para a pedagoga e mestre em psicologia Maria da Consolação, o perfil do adolescente praticante coincide, normalmente, com o valentão que tenta constranger o outro, usando, para isso, relações de poder. Por outro lado, as vítimas são crianças que sofrem de baixa auto-estima, ou seja, pessoas que podem estar suscetíveis. Em seu consultório, a profissional atende adolescentes que começam a ser “zoados”, por meio de críticas ou frases depreciativas, devido a diversos motivos, como, por exemplo, ganho excessivo de peso, cabelo crespo, cor da pele, nível social, entre outros. Isto é, são aqueles que, geralmente, estão fora dos padrões culturalmente formatados e seguidos pela sociedade.

 

Segundo a psicopedagoga Maria da Consolação, costuma ser difícil, para os professores, distinguir uma brincadeira inocente de um caso de bullying. Isso ocorre, principalmente, porque as vítimas têm muito medo de denunciar seus agressores. Já os pais apresentam dificuldade em aceitar que seus filhos sejam as vítimas ou agressores.

 

A orientadora da Escola Municipal Frei Edgard Groot em Betim, no estado de Minas Gerais, Sandra Aníbal, conta um caso ocorrido na escola e que demonstra todas as dificuldades enfrentadas pelos professores. “Havia um grupo de meninas já formado e bastante popular na escola. A líder impôs como desafio para outras meninas que quisessem participar do grupo, que elas andassem no período do intervalo com uma placa escrito “Chute-me””, narra Sandra. Os pais das meninas foram convocados para discutir a questão e propor soluções. No entanto, a mãe da líder argumentou que a filha não havia feito nada de errado.

 

O excesso de cobranças e responsabilidades impostas as crianças e adolescentes são, segundo a psicopedagoga, Maria da Consolação, um dos fatores que mais contribuem para a baixa auto-estima das crianças e adolescentes, tornando-os potenciais vítimas ou praticantes de bullying. Quem o pratica adota uma posição agressiva como forma de se sobressair, de sobreviver, enquanto quem o sofre são aqueles indivíduos mais frágeis, que não conseguiram criar instrumentos de defesa.

 

A psicóloga Sônia Flores esclarece quais seriam os tipos mais comuns de atos praticados pelos bullys – isto é, aqueles que praticam a ação -, para ajudar pais e professores a reconhecerem o problema: “Normalmente o agressor insulta a vítima com frequência e sem qualquer motivo, danifica sua propriedade, espalha rumores falsos, coloca a vítima em situação delicada frente a superiores, faz comentários depreciativos sobre a família da vítima, a isola socialmente, usa de chantagens ou ameaças, cria páginas falsas sobre a vítima em sites de relacionamento”.

 

Sandra Prado afirma que para prevenir os casos de violência na escola, são organizadas palestras com os pais. Porém, o mais eficaz tem sido orientar os próprios alunos e envolvê-los em projetos de cidadania, mostrando e discutindo seus direitos e deveres no convívio social. Quando é constatado um caso como o relatado acima, a escola deve pedir aos pais que providenciem acompanhamento especializado para os filhos, pois infelizmente grande parte das escolas municipais não têm como oferecer tratamento psicológico para seus alunos.

 

* Viviane Afonso de Araújo é aluna do curso de jornalismo do Centro Universitário Belo Horizonte

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